Após o Senado votar pela admissibilidade do processo de impeachment
de Dilma Rousseff, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
Joaquim Barbosa questionou a maneira como o processo foi conduzido e,
embora tenha admitido que Dilma falhou como presidente, disse que Michel
Temer não tem legitimidade para governar o País. Para ele, o ideal
seria que novas eleições fossem convocadas, mas admitiu que dificilmente
o STF aprovaria algo desse tipo.
Barbosa participou nesta
quinta-feira de evento em São Paulo, para o qual foi convidado para
discorrer sobre as instituições brasileiras. Afirmou ter sido uma
coincidência o evento ter caído no mesmo dia em que o Senado votou o
processo de impeachment. Aproveitou, portanto, para fazer algumas
provocações aos parlamentares.
“Tenho sérias duvidas quanto à
integridade e à adequação desse processo pelo motivo que foi escolhido.
Se a presidente tivesse sendo processada pelo Congresso por sua
cumplicidade e ambiguidade em relação à corrupção avassaladora mostrada
no País nos últimos anos, eu não veria nenhum problema. Mas não é isso
que está em causa”, afirmou.
Para Barbosa, o descumprimento de
regras orçamentárias, principal motivo apontado no pedido de
impeachment, não é forte o suficiente para afastar um presidente. “Temos
um problema sério de proporcionalidade, pois a irresponsabilidade
fiscal é o comportamento mais comum entre nossos governantes em todas as
esferas. Vejam a penúria financeira dos nossos Estados, o que é isso
senão fruto da irresponsabilidade orçamentária dos governadores”,
provocou.
O ex-ministro reconheceu que, “do ponto de vista
puramente jurídico”, o impeachment pode ser justificado, mas disse que
tem “dúvidas muito sinceras” quanto à sua “justeza e ao acerto político
que foi tomado para essa decisão”. “O impeachment é a punição máxima a
um presidente que cometeu um deslize funcional gravíssimo. Trata-se de
um mecanismo extremo, traumático, que pode abalar o sistema político
como um todo, pode provocar ódio e rancores e tornar a população ainda
mais refratária ao próprio sistema político”, alertou Barbosa.
Ele
também não poupou críticas a Dilma Rousseff. Para ele, a petista não
soube conduzir o País, não soube se comunicar com a população, fez
péssimas escolhas e limitou-se a governar para seu grupo político e
aliados de ocasião. “Não digo que ela compactuou abertamente com
segmentos corruptos em seu governo, em seu partido e em sua base de
apoio, mas se omitiu, silenciou-se, foi ambígua e não soube se
distanciar do ambiente deletério que a cercava, não soube exercer
comando e acabou engolida por essa gente”, disse.
Apesar das
críticas a Dilma, Barbosa afirmou que Temer não tem legitimidade para
governar o Brasil. “É muito grave tirar a presidente do cargo e colocar
em seu lugar alguém que é seu adversário oculto ou ostensivo, alguém que
perdeu uma eleição presidencial ou alguém que sequer um dia teria o
sonho de disputar uma eleição para presidente. Anotem: o Brasil terá de
conviver por mais 2 anos com essa anomalia”, afirmou o ex-ministro, que
também criticou o PSDB. “É um grupo que, em 2018, completará 20 anos sem
ganhar uma eleição”.
A solução, disse Barbosa, seria a convocação
de novas eleições. “Eliminaria toda essa anomalia e o mal estar com o
qual seremos obrigados a conviver nos próximos dois anos”. Admitiu, no
entanto, que provavelmente o STF rejeitaria a aprovação no Congresso de
uma emenda constitucional para a convocação de novas eleições. Diante
disso, afirmou que Dilma deveria ter renunciado há alguns meses, sob a
condição de que Temer fizesse o mesmo e, assim, o Congresso fosse
obrigado a convocar novas eleições, sem necessidade de emendas.
Ao
fim de sua palestra, Barbosa ressaltou que está preocupado com o futuro
das instituições brasileiras. “Eu me pergunto se esse impeachment não
resultará em golpe certeiro em nossas instituições, eu me pergunto se
elas não sairão fragilizadas, imprestáveis”, questionou. “E vai aqui
mais uma provocação: quem na perspectiva de vocês, vai querer investir
em um País em que se derruba presidente com tanta ligeireza, com tanta
facilidade e com tanta afoiteza? Eu deixo essa reflexão a todos”,
concluiu.
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